ALGUMAS REGRAS PARA A MONTAGEM DE MOLDES PARA MATÉRIAS PLÁSTICAS – MONTAGEM E ENSAIO DOS MOLDES

I – ENQUADRAMENTOOs moldes são protótipos que por vezes se transformam em autênticas máquinas de grande complexidade, de uma variedade praticamente infinita, que têm de ser projectados, construídos e testados em tempo extremamente reduzido e com custos que se pretendem os mais baixos possível. Esta situação impõe a necessidade de técnicos altamente qualificados, com uma longa e variada experiência, capazes de dialogar com a multitude de situações técnicas possíveis, através de actuações eficazes e eminentemente práticas. Estão vedados à Indústria de Moldes, por razões de custo e de tempo, muitos estudos rigorosos e análises sistematizadas, próprios de outros sectores industriais por vezes bem menos complexos.

Esta desafiante e contraditória situação que implica a necessidade de elevada eficácia e rigor de actuação, sem a possibilidade do estudo e do tempo que lhes corresponderiam, tem a nosso ver saída: a criação de um largo conjunto de princípios Gerais ou Normas que, cobrindo os htmectos comuns à maioria dos moldes, sejam amplamente divulgados, profundamente entendidos e disciplinadamente aplicados. Este trabalho pretende contribuir para essa finalidade.

II – METODOLOGIA

Seguimos o princípio de que é vantajoso tratar esta indústria através das suas diferentes especialidades ou profissões (projecto, fresagem, montagem, etc.), que radica na tradição portuguesa do sector, que é original e consideramos dever ser prosseguida e enriquecida.

Partimos ainda da convicção de que a Montagem, conjuntamente com o Projecto, são os dois sectores da Indústria de Moldes de maior relevância técnica e económica e aqueles em que mais se justifica o estudo original e sistemático de uma experiência nacional.

As razões porque assim pensamos são várias e derivam dos seguintes factos:

  a) O Projecto condiciona de uma maneira decisiva, a eficácia e o custo de todas as operações que vão ser sucessivamente realizadas.
  b) A Montagem avalia a qualidade de todos os componentes produzidos e determina critérios de exigência e rigor que podem influenciar positivamente toda a produção.
Além de que, como controlo final do molde produzido, é garantia da sua qualidade e funcionalidade, e assim, da satisfação do utilizador.

Ainda nesta perspectiva e pelo que mais adiante defenderemos, o montador de moldes deveria ser um técnico qualificado, profundo conhecedor do projecto e do funcionamento mecânico, eléctrico ou hidráulico de cada molde, mais do que um executante de formas ou superfícies que são idealmente a tarefa das maquinações.

Tomámos, enfim, conscientemente a posição de procurar novas formas para a construção de moldes, que possibilitem à nossa indústria uma originalidade técnica, como meio de a tornar mais competitiva e prestigiada nos mercados internacionais. Finalmente, este trabalho baseia-se nas condições concretas deste sector industrial em Portugal e poderá não ser integralmente aplicável em condições diferentes.

III – PRINCÍPIOS PARA A MONTAGEM DOS MOLDES

Neste capítulo enumeramos um conjunto de princípios que, se seguidos com rigor, resultarão em maior eficácia do trabalho de Montagem, maior qualidade dos moldes produzidos e menores custos de produção:

1 – O TRABALHO DE MONTAGEM deve ser de estudo e de «aperto de parafusos». Queremos com isto dizer que a FORMA das peças, isto é, todos os contornos, perfis, raios, cantos, rasgos, etc., etc., que são as cavidades, buchas, postiços, movimentos, etc. dos moldes devem ser totalmente realizados em máquinas, antes ou/e depois do tratamento térmico, se este existir.
Consideramos, portanto, que no nosso tempo existem máquinas capazes de realizar, com vantagem, todas as formas possíveis, sendo o problema apenas definir com rigor as formas a obter através do Projecto, ou em casos excepcionais através de um modelo tridimensional.
0 restante cabe a uma disciplina de maquinação que não permita imperfeições e acabamentos insuficientes ou parciais, a serem supridos pela Montagem.

2 – A parte mais importante do trabalho do oficial montador de moldes, definidora do bom profissional, é o ESTUDO RIGOROSO DO TRABALHO A REALIZAR antes de iniciar a montagem propriamente dita. Este estudo compõe-se de:

  2.1. – Estudo do projecto do molde, de forma a obter uma completa familiarização com os seus órgãos e funcionamento.
  2.2. – Inventário de todas as peças que compõem o molde, no sentido de verificar o seu grau de acabamento e determinar quaisquer faltas de peças ou operações não realizadas.
Para tal deve existir uma lista de todas as peças, elaborada pelo Gabinete de Projecto, que pode ser a legenda do desenho do molde.
  2.3. – Análise crítica do projecto do molde, na óptica do Oficial Montador, afim de elaborar um plano geral de montagem, como por exemplo, quais as operações a realizar primeiro, qual a interdependência de operações, etc.
Nesta fase do estudo devem ser tomadas notas de quaisquer htmectos que simplifiquem o trabalho de montagem, a expor ao responsável pelo Projecto.
  2.4. – Análise dos factores diferenciadores do molde, isto é, elementos prioritários à satisfação do cliente, tais como: precisão, aparência, ciclo, eficácia mecânica, vida da ferramenta, etc., no sentido de atender particularmente a esses factores.
Pensamos que nem sempre se dá a devida atenção a este htmecto, que é importante, por não serem coincidentes no mercado os desejos dos diferentes clientes; na nossa indústria a satisfação do cliente é a melhor e mais económica condição para vendas futuras a preços rentáveis.
  2.5. – Análise do grau de complexidade dos moldes tendo em vista os objectivos de funcionamento: tecnologia de moldação, funcionamento dos diferentes órgãos (mecânicos, eléctricos, hidráulicos) e tentativa de antecipação dos problemas daí derivados.
Nesta fase, o oficial montador deve proceder a uma análise crítica em colaboração com o ensaiador de moldes, se este cargo existir na empresa.
  2.6. – Leitura cuidadosa das especificações do molde a montar, ou quaisquer outros elementos informativos existentes.

3 – REALIZAÇAO DE UM PLANO GERAL do trabalho de Montagem compreendendo:

  3.1. – Ordenação das operações de montagem, no sentido de encontrar o melhor caminho – percurso – com o objectivo de diminuir o tempo total de montagem, antecedendo a detecção de quaisquer falhas ou erros.
Exemplo: dar prioridade às operações que têm que ver com o funcionamento do molde deixando para segundo plano operações de acabamento de superfícies, ou outras operações menores; assim não só se encontram quaisquer erros mais rapidamente, como mais cedo se podem realizar operações de maquinação complementar ainda necessárias. Por outro lado, permite determinar qual a mais longa linha de interdependências, isto é, conjuntos de operações que dependem umas das outras, para realizar primeiro aquelas que mais dependências provocam.
  3.2. – Plano dos pontos de inter-relacionamento das diferentes peças do molde com vista à rectificação e montagem. Queremos com isto dizer, que em cada molde existem pontos definidos dimensionalmente que são áreas de relação de umas peças com outras – cavidades com buchas, ambas com movimentos, etc. – pontos que são de variada importância – uns mais importantes que outros – e que importa conhecer muito bem afim de ser possível ter um plano que sirva a sequência prevista.
Este htmecto é importante, principalmente se pensarmos que é um ponto de partida para uma definição mais rigorosa de pontos de referência normalizados.
  3.3. – Definição das operações que devem ser realizadas pelo chefe de equipa e daquelas que podem e devem ser realizadas pelos ajudantes. Um bom chefe de equipa é aquele que mais trabalho dos seus colaboradores, com a necessária qualidade, consegue obter com o mínimo de trabalho executivo próprio.
Desta forma não só se realizam mais moldes, como se formam mais rapidamente os especialistas de montagem.

4 – CONTROLO DE UM CONJUNTO DE DIMENSÕES em áreas que anteriormente chamamos de inter-relacionamento, com a finalidade de «conhecer» as diferentes peças e programar as correcções eventualmente necessárias para que o trabalho de montagem, propriamente dito, resulte sem interrupções ou quebras de sequência.
Notar que não se trata de duplicar o trabalho realizado pelo controlo de qualidade, que deve ser sistemático e total, mas é realizado ao longo de muitas semanas em cada peça individualizada e não na óptica do conjunto que é a função da Montagem.
A necessidade destas medições resulta ainda do rigor obtido, quer na maquinação das peças quer no próprio controlo de qualidade, nem sempre ser o ideal, tornando necessário a reverificação de algumas áreas-chave. Alguns exemplos:

  4.1. – Medição das caixas da estrutura e dimensões exteriores das cavidades e buchas.
  4.2. – Medição das caixas para os movimentos, sua localização relativamente às buchas, ou se fôr caso disso às cavidades, bem como a medição das áreas correspondentes aos movimentos.
  4.3. – Medição das espessuras das placas, analisando a sua relação com os elementos moldantes com quaisquer batentes que existam, e determinando as alturas dos extractores, pernos, etc.
  4.4. – Medir a localização dos balancés ou quaisquer outras peças que necessitem alinhamento entre diversas placas, determinando as rectificações necessárias.
  4.5. – Medição das barras de deslize, barras de aperto e todas as peças acessórias, nas áreas que afectem a montagem, etc.

5 – EMITIR NOTAS DE REQUISIÇÃO que podem ser formalizadas ou não, destinadas ao encarregado da Montagem, para todas as operações que sejam necessárias ao acabamento do molde e devam ser realizadas fora da secção, tais como:

  5.1. – Polimentos.
  5.2. – Furações não executadas.
  5.3. – Arestas a remover por maquinação.
  5.4. – Mandrilagem de furos para injector, anel de centragem ou outros.
  5.5. – Rectificação plana, cilíndrica ou de interiores em falta, ou que se verifique necessária por o rigor das diferentes peças não ser suficiente, relativamente às necessidades da Montagem, etc. etc.

6 – REALIZAÇÃO DA MONTAGEM propriamente dita, no quadro das seguintes acções:

  6.1. – Divisão das tarefas entre o chefe da equipa de Montagem e o seu ajudante ou ajudantes. Tarefas típicas para os ajudantes são:
  6.1.1. Montagem dos componentes da refrigeração e seu ensaio.
  6.1.2. Realizar atarrachamento em falta.
  6.1.3. Eliminar pequenas arestas.
  6.1.4. Arredondar arestas nos canais de injecção e áreas moldantes.
  6.1.5. Posicionamento das cabeças dos extractores.
  6.1.6. Montagem de postiços nas cavidades e buchas, etc.
  6.2. – Tarefas típicas para o chefe da equipa são:
  6.2.1. Rascamento das caixas quando necessário.
  6.2.2. Realizar os ajustamentos ainda em falta.
  6.2.3. Montagem das cavidades, buchas, movimentos, balancés, etc.
  6.2.4. Cálculo do aço a remover para rectificação final nos cones dos movimentos, blocos de travamento, etc.
  6.2.5. Montagem da extracção e ensaio do seu correcto alinhamento.
  6.2.6. Fecho do molde totalmente montado, para controlo do ajustamento do conjunto com e sem blocos de travamento, etc.

7 – CONTROLO FINAL DO MOLDE antes do ensaio, nomeadamente:

  7.1. – Diâmetro do anel de centragem e raio do injector.
  7.2. – Dimensões exteriores totais do molde.
  7.3. – Verificar quais as áreas do molde a utilizar para a fixação do molde nas máquinas de produção e de ensaio, no sentido de garantir a existência de condições críticas a essa fixação, como por exemplo: furos das máquinas em posição conveniente, inexistência de obstáculos às barras de fixação, como ligações de água, óleo ou ar, cilindros, guias da máquina etc.
  7.4. – Localização dos furos para os extractores da máquina e existência dos extractores necessários, quer relativamente à máquina de produção, quer à máquina de ensaio.
  7.5. – Controlo da refrigeração sob pressão, numeração dos circuitos e indicação das entradas e saídas.
  7.6. – Controlo do polimento de todas as áreas, nomeadamente no topo dos extractores.
  7.7. – Verificação das gravações, nomeadamente números das peças moldadas, números de cavidades, etc.
  7.8. – Nos moldes de canais quentes: controlar o correcto funcionamento de todas as resistências e sondas de controlo de temperatura e verificar se as folgas para expansão do sistema – carburador e bicos de injecção – são anuladas pelo aquecimento, encontrando-se o sistema correctamente calculado.
  7.9. – Verificar o funcionamento de eventuais «micro-switches»
  7.10. – Verificar a estanquicidade dos sistemas hidráulicos ou pneumáticos.
  7.11. – Verificar a existência de suficientes saídas de ar e de gases,tendo em vista o material a moldar e os locais de entrada do material plástico no molde.
  7.12. – Verificar a existência e funcionamento dos órgãos de segurança do molde, nomeadamente, fixação dos movimentos, limitadores de curso, recuo antecipado das chapas dos extractores quando exista interferência com outros órgãos do molde, etc.

8 – REALIZAR O ENSAIO FINAL DO MOLDE em condições tão reais e próximas da produção quanto possível. Algumas das condições para esse ensaio são:

  8.1. – Nas empresas onde exista um especialista ensaiador, este deve estudar antecipadamente o funcionamento do molde a ensaiar através dos desenhos e de perguntas feitas ao oficial montador.
Havendo disponibilidade de tempo, o ensaiador deve assistir à montagem final do molde.
  8.2. – 0 ensaiador dos moldes é responsável pela montagem do molde na máquina, pela existência das matérias primas necessárias e seu tratamento, pelas condições de moldação, etc.
Nos casos em que não existe o ensaiador, estas tarefas podem ser realizadas conjuntamente pelo oficial responsável pela montagem e pelo operador da máquina, ainda que seja mais difícil nestas condições uma previsão e controlo eficaz do ensaio.
  8.3. – Em qualquer dos casos o oficial montador é responsável pelo grau de acabamento, qualidade e segurança do molde bem como pela realização de quaisquer correcções necessárias ao seu bom funcionamento na máquina.
  8.4. – 0 oficial montador, deve elaborar um relatório respeitante às condições de funcionamento do molde e o ensaiador um relatório sobre as condições de moldação, máquina e matérias primas utilizadas.
Estes relatórios devem ser feitos em impressos próprios que sistematizem a informação necessária e limitem ao máximo o trabalho de preenchimento.
  8.5. – As amostras moldadas devem ser produzidas nas quantidades especificadas pelo cliente e cuidadosamente embaladas.
  8.6. – Os ensaios dos moldes são operações de elevado custo pelo que devem ser realizados apenas, após cuidadoso estudo e quando estão garantidas as condições necessárias ao correcto funcionamento do molde.

Henrique Neto, 1983
1º Congresso da Indústria de Moldes – Cefamol